Os fatos vão se desdobrando na Venezuela, como um verdadeiro teatro a serviço do totalitarismo, uma ficção real que joga à margem da incerteza e de uma crise humanitária, um povo já sofrido demais pela vaidade de um tiranete deprimente, com o suporte de um eixo autocrático que quer valer os seus interesses, nem que para isso a soberania venezuelana tenha sido negociada por um preço. Perseguições políticas à pleno e a promessa cumprida de Maduro, do seu “banho de sangue”. Do lado da oposição, a única esperança é a guarda das atas eleitorais que demonstram uma vitória histórica e inquestionável. A incerteza absoluta do futuro breve da Venezuela é um ingrediente desanimador, mas cabe-nos, por meio de uma lente prospectiva, levantarmos alguns cenários sobre o que podemos esperar para as próximas semanas. Quando falamos em análise do futuro, podemos construir três cenários possíveis: 1) o que é provável (ou seja, o que provavelmente acontecerá, ao menos sem que haja uma ruptura do paradigma); 2) o que é plausível (futuros que podem ocorrer); e 3) o que é possível (os cenários mais radicais, ou remotos). Assim temos os cenários: 1) a banalidade do mal; 2) a instabilidade geopolítica; e 3) a ingerência internacional.
A banalidade do mal
As instituições venezuelanas, entre elas o executivo, o legislativo e o judiciário (o grande teatro eleitoral), para usar o conceito de Hannah Arendt, estão a serviço do mal, sem qualquer tipo de constrangimento, essencialmente títeres da pior espécie. Nesse cenário, a oposição não consegue firmar a necessária derrocada de Maduro e as potência ocidentais recuam em agir, para não contrariar os interesses chineses, russos e iranianos. Sanções econômicas surgem e até podem debilitar o regime, porém não o suficiente para derrubar Maduro. A repressão interna aprofunda-se, com o custo de vidas e com o encarceramento da oposição. As instituições jogam com a banalidade do mal e não há pressão diplomática capaz de mudar esse cenário
A instabilidade geopolítica a favor do regime
Nesse cenário, há um extravasamento da conjuntura interna, quase inevitável. Além de toda a deprimente fraude eleitoral, Maduro persegue com os seus interesses aventureiros, inclusive na Guiana, abrindo espaço para algum conflito regional embalado pelos interesses da China e da Rússia. A manobra poderia ser um recurso para retirar o foco das questões internas. Muitas vezes, os conflitos externos são suscitados para desviar as atenções. Aqui, a pressão das grandes potências em refrear os apetites de Maduro, não é qualquer garantia, ainda mais levando-se em conta os seus principais aliados, cujo objetivo central é o de esculhambar com a geopolítica.
A Ingerência internacional
O cenário mais radical seria o de algum tipo de intervenção coordenada, para demover Maduro do poder. Isso dependeria do grau da crise humanitária estabelecida. Milhares vão fugir, mais uma vez, do regime. Esse cenário seria o da realpolitik, ou seja, do realismo puro, todavia potencialmente improvável, pelo déficit de líderes capazes de impô-la. Basta vermos o caso ucraniano. As potências ocidentais não conseguiram refrear os apetites do aventureiro Putin, que faz o que quer na porta da Europa.