Por Rossana Stella oliva Braghini- Psicanalista
Eu imagino que as pessoas, de uma forma mais ou menos unânime, tenham lugares de infância onde desejariam ardentemente voltar, posto que estes lugares condensam muitas cenas carregadas de afeto, que a nossa memória insiste em conservar. Comumente estas cenas-lembranças são imagens em forma de flashes, compostas com fragmentos perceptuais somados a frações de nossa fantasia. Fato que, aliás, em nada muda o caráter de realidade e intensidade que estas cenas têm para nós. Tanto é assim, que a simples evocação destas lembranças nos causa uma nostalgia ímpar, quando não uma comoção afetiva.
Eu tenho três lugares assim, de igual importância, mas de cronologia diversa.
O primeiro foi o apartamento onde cresci e morei até os 10 anos em Caxias com meus pais e irmãs. O segundo lugar foi a casa da minha avó materna em Erechim. Simplesmente mágica! O terceiro é um colégio, em Novo Hamburgo, chamado de Fundação Evangélica, onde estudei em regime de internato e fiz amigos de muitos predicados.
É deste terceiro que quero falar. A Fundação, como carinhosamente a chamávamos, quando voltei a Caxias para oitava série, evidentemente parou de fazer parte do meu dia a dia. E, não sei direito porque, talvez pela idade ou pela tristeza da separação, sucumbiu ao recalque, e ficou apenas na lembrança que retornava ora em músicas, ora em nomes parecidos de alguns colegas, que pelas saudades logo procurava afastar. Procurei-os mais tarde, é verdade, mas sem sucesso algum. Como vínhamos de vários lugares do Brasil, achei que tínhamos nos perdido por este mundão. Mas, bendito Facebook, nos achamos...
Escritos emocionados, reencontros marcados, dia 15 do mês que vem será o grande dia! E inusitadamente surge uma angústia. Busco em mim o porquê. Lembro do morrinho onde ficávamos tocando violão, da carinha da Bety, da Mônica, imensas saudades da Vânia, das escadas, dos quartos, dos nossos cantos de tantas conversas, dos nossos cantos onde tecíamos histórias fantásticas sobre os personagens que tinham habitado aquelas paredes antes de nós, dos primeiros namoricos com os meninos do externato, enfim, pessoas e lugares amistosos que ganharam um colorido mágico no meu coração-memória. Então, por que a angústia?
Contando esta história para a minha filha mais velha, Nathália, ela matou a charada quando me perguntou: ‘tu não tem medo que a realidade de hoje estrague a memória do passado?’
Pensei: ‘não medo, pavor! Pavor da perda das minhas queridas lembranças tão perfeitas, tão bem ajustadas.’