O que há por trás do feminicídio

A grande maioria dos casos de feminicídio ocorre em função da não aceitação por parte do homem do término do relacionamento

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Tamires Passos Decimo é psicóloga clínica especialista em orientação analíticaTamires Passos Decimo é psicóloga clínica especialista em orientação analítica
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É alarmante o número crescente de casos de feminicídio, isto é, o assassinato de mulheres cometidos em razão do gênero, nos últimos anos, especialmente no Brasil. Em contrapartida, percebe-se, igualmente, aumento no número de protestos e tentativas de resolução para este tipo de crime. Cabe, certamente, fazer-nos alguns questionamentos sobre qual a razão desse aumento significativo de casos e quais seriam as possibilidades de resolução.


Vale destacar que Freud, já em 1932, no texto “Por que a guerra?” (embora não fosse o único momento em que ele se refere a isso), afirmava que todo o ser humano é habitado por “impulsos” agressivos e destrutivos que precisam ser, de alguma maneira, desviados da destrutividade e orientados ou escoados para outras atividades, aceitas culturalmente, para que seja possível a vida em sociedade e o avanço da civilização. Pode-se pensar que esses caminhos alternativos que poderiam ser através da arte, dos esportes, do próprio trabalho, parecem não estar sendo devidamente constituídos, pois é notável o aumento não só do feminicídio, mas das diversas formas de violência e intolerância entre os seres humanos.

 

Mudança de cenário
A história da sociedade é marcada pelo patriarcado, ou seja, “a dominação do homem sobre a natureza e a mulher” e a caracterização do poder masculino através do sustento da família, enquanto a mulher, dependente de um homem, ofertava em troca, a reprodução e o trabalho doméstico. É evidente a considerável mudança deste cenário nos últimos tempos, no qual a mulher passou a se ferramentar com estudo, conquistas e inserindo-se cada vez mais no mercado de trabalho. Essa inserção tornou-se evidente a partir da IIª Guerra Mundial, onde muitas mulheres tiveram de assumir a posição dos homens no sustento familiar. A partir daí, muitos foram os movimentos femininos em busca de independência e poder de escolha. Essas mudanças são relativamente novas para a história da civilização e ainda é possível perceber dificuldades na aceitação dos movimentos de poderio feminino. Na história da sociedade brasileira, era o patriarcado o modelo de família a ser formado, o que levou a dominação masculina para outras instituições: políticas, sociais, religiosas e etc. O grande enigma a ser decifrado, nos dias atuais, parece dizer respeito a seguinte questão: Como os homens estão constituindo sua masculinidade enquanto provenientes de uma história de dominação sobre a mulher e diante dos atuais movimentos de independência feminina?

 

A intolerância
Percebe-se que a grande maioria dos casos de feminicídio ocorre em função da não aceitação, por parte do homem, do término do relacionamento, acionando a intolerância de lidar com o fato de que a mulher tem vontade própria e que ela pode optar não seguir em um relacionamento do qual ela não está satisfeita. Apesar do movimento feminino de independização e conquista do próprio espaço ser uma mudança cultural importante, há de se pensar, certamente, que há falhas significativas não só no processo de constituição da masculinidade, mas na constituição humana, na formação da ética e da capacidade de considerar o outro como alguém com sentimentos e desejos singulares e não, como objeto de satisfação pessoal. Essa intolerância, resultante de falhas na constituição do sujeito, parece ser o que leva a trágicas histórias de feminicídio e a destruição da possibilidade da mulher de se posicionar de forma autônoma e independente.

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