Pichações que o tempo não apaga
O barranco foi o primeiro outdoor que conheci. O mais natural de todos os espaços. Já era ecológico, pois a tinta a cal da pintura não agredia a natureza e ainda corrigia a acidez do solo. Além do revezamento dos recicláveis políticos, os barrancos ostentavam mensagens comerciais. A mais emblemática, com certeza, foi a das Casas Pernambucanas. Era a dona dos barrancos de Norte a Sul em pontos estratégicos, preferencialmente em cortes lisos nas rochas. Publicidade pura com conotação de pichação em época de ditadura. Seguindo as Pernambucanas, a sua concorrente Buri também gastou muita cal. Mas a campanha mais emblemática foi a da gaúcha Vontobel, que instituiu o seu doce de leite Mu-Mu. Nos barrancos ou com suas plaquinhas na entrada das cidades anunciava: “Aqui tem Mu-Mu”.
Isso tudo lá pelos anos 1960, quando as distâncias eram as mesmas, mas as viagens ficavam bem mais longas. E, de tão raras, assumiam a condição de um evento. Junto aos efeitos especiais dos buracos, havia o realismo da poeira ou do barro. Vir de Erechim a Passo Fundo era um acontecimento. A piazada tinha muitos detalhes para contar sobre o novo ônibus da Unetral, uma carroceria Pullman da Eliziário, ou da nova rodoviária de Passo Fundo na Vila Rodrigues. É claro que tudo aquilo que encontrávamos na cidade propiciaria muitos causos, quando não casos cabulosos. Mas a viagem, literalmente, era uma viagem. Nessa realidade infanto-juvenil, sonhada sobre as rodas de um chassis Scania, a paisagem sempre causava um deslumbre. Quando não inquietante. Até cotávamos quantas vezes a gente passava por um barranco das Pernambucanas.
Já havia algumas plaquinhas de beira de estrada, que hoje seriam filhotes de outdoors. Basicamente anunciavam algo bem próximo, como uma borracharia ou posto de combustíveis. O outdoor artesanal era menor ainda, geralmente nos portões das propriedades rurais, escrito a carvão, anunciava mel, milho-verde, bergamota, salame, queijo, galinha, ovos e tantas outras maravilhas daquilo que chamávamos de colônia. Mas, na volta, o mais importante mesmo era saber quantos barrancos das Pernambucanas contou na viagem. Ou, com ar de superioridade, falar sobre a surpreendente constatação de que em Passo Fundo também havia Mu-Mu.
Asfalto ou Garcia?
Com cortes enormes para o leito da estrada, a Transbrasiliana era um convite à pichação. Sem asfalto via Getúlio Vargas, servia como uma espécie de voo direto entre Passo Fundo e Erechim. Naquela época, a promessa de asfaltamento já era uma piada. Desde então, foi utilizada para exemplificar o inacreditável. Somente alguns anos depois, ganhou a companhia de outra máxima do impossível, aquela de quando o Sargento Garcia prender o Zorro.
Mas, anedotário de lado, lá pelos anos 1980, quando um ataque de crateras lunáticas atingiu o asfalto entre Passo Fundo e Sertão, a descamisada Transbrasiliana se transformou na melhor opção. E ainda é. Pena que esse trechinho virou piada. E, agora, entre o asfalto e o Garcia, você aposta em quem? Eu até acredito na destreza do Garcia, pois o tempo passou, o Zorro já não é mais o mesmo e até pode dar bobeira...
Apertem a descarga
É insuportável a barulheira que as motos andam fazendo pelas ruas de Passo Fundo. E não me venham com aquela desculpa esfarrapada de que a descarga estragou há pouco. Estão usando escapamentos “esportivos”! Ora, então sabem muito bem que estão fazendo barulho. Isso, é claro, se ainda não estiverem surdos. Mas, ao que parece, isso já virou rotina. Mudaram as leis do trânsito? Não existe mais a Lei do Silêncio? Alteraram as limitações de ruído ambiental? Ou os motoqueiros já gozariam de algum tipo de “novas prerrogativas”?
Ponto fixo?
Mesmo após a ação da fiscalização, persistem privilégios naquele trechinho da Área Azul na Avenida Brasil. Se o limite de permanência é de duas horas, por que há carros que ficam cinco ou seis horas no mesmo lugar?
Trilha Sonora
Saxofone. Um sax para ouvir com fones. Isso não é um trocadilho. É um convite.
Brian Smith – Your Lasted Trick/Smooth Operator